Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

No Labirintto Z

"Este labirinto [ruas indefinidas] de linhas retas, não de complexidade, aonde o leva o tempo de um homem cuja verdadeira vida está longe." (Jorge Luis Borges)

No Labirintto Z

"Este labirinto [ruas indefinidas] de linhas retas, não de complexidade, aonde o leva o tempo de um homem cuja verdadeira vida está longe." (Jorge Luis Borges)

Corridinho

08.07.04, Zana
Adélia Prado

O amor quer abraçar e não pode.
A multidão em volta,
com seus olhos cediços,
põe caco de vidro no muro
para o amor desistir.
O amor usa o correio,
o correio trapaceia,
a carta não chega,
o amor fica sem saber se é ou não é.
O amor pega o cavalo,
desembarca do trem,
chega na porta cansado
de tanto caminhar a pé.
Fala a palavra açucena,
pede água, bebe café,
dorme na sua presença,
chupa bala de hortelã.
Tudo manha, truque, engenho:
e descuidar, o amor te pega,
te come, te molha todo.
Mas água o amor não é.

Leva-me a um lugar

08.07.04, Zana
Hilda Hilst

Leva-me a um lugar onde a paisagem
se pareça àquela das visões da mente.
Que seja verde o rio, claro o poente
que seja longa e leve a minha viagem.

Leva-me sem ódio e sem amor
despojada de tudo que não seja
eu mesma. Morna estrutura sem cor
a minha vida. E sem velada beleza.

Leva-me e deixa-me só. Na singeleza
de apenas existir, sem vida extrema.
E que nos escuros claustros do poema
eu encontre afinal minha certeza.

Aflição

08.07.04, Zana
Hilda Hilst

Aflição de ser eu e não ser outra.
Aflição de não ser, amor, aquela
Que muitas filhas te deu, casou donzela
E à noite se prepara e se adivinha

Objeto de amor, atenta e bela.
Aflição de não ser a grande ilha
Que te retém e não te desespera.
(A noite como fera se avizinha.)

Aflição de ser água em meio à terra
E ter a face conturbada e móvel.
E a um só tempo múltipla e imóvel

Não saber se se ausenta ou se te espera.
Aflição de te amar, se te comove.
E sendo água, amor, querer ser terra.